sexta-feira, 21 de março de 2014

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN...


Como ela própria afirmou:

"(...) Eu posso dizer que escrevo para transformar o mundo. Eu penso que a poesia deve transformar o mundo!"


             
1919-2004  


     
Este é o tempo 

Este é o tempo...
Da selva mais obscura 
Até o ar se tornou grades 
E a luz do sol se tornou impura 
Esta é a noite 
Densa de chacais 
Pesada de amargura 
Este é o tempo em que os homens renunciam.

in Mar Novo, (1972)



INSCRIÇÃO

Quando eu morrer voltarei para buscar
os instantes que não vivi junto do mar

                       
                   Sophia de Mello Breyner Andresen

Mar

Mar, metade da minha alma é feita de maresia
Pois é pela mesma inquietação e nostalgia,
Que há no vasto clamor da maré cheia,
Que nunca nenhum bem me satisfez.
E é porque as tuas ondas desfeitas pela areia
Mais fortes se levantam outra vez,
Que após cada queda caminho para a vida,
Por uma nova ilusão entontecida.

E se vou dizendo aos astros o meu mal
É porque também tu revoltado e teatral
Fazes soar a tua dor pelas alturas.
E se antes de tudo odeio e fujo
O que é impuro, profano e sujo,
É só porque as tuas ondas são puras.


Sophia de Mello Breyner Andresen, Poesia I

As pessoas sensíveis não são capazes

De matar galinhas

Porém são capazes

De comer galinhas



O dinheiro cheira a pobre e cheira

À roupa do seu corpo

Aquela roupa

Que depois da chuva secou sobre o corpo

Porque não tinham outra

O dinheiro cheira a pobre e cheira

A roupa

Que depois do suor não foi lavada

Porque não tinham outra



«Ganharás o pão com o suor do teu rosto»

Assim nos foi imposto

E não:

«Com o suor dos outros ganharás o pão»



Ó vendilhões do templo

Ó construtores

Das grandes estátuas balofas e pesadas

Ó cheios de devoção e de proveito



Perdoai-lhes Senhor

Porque eles sabem o que fazem


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