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quarta-feira, 20 de maio de 2015

Refrigério para o nosso espírito...


POEMA


Quando chego a casa

Cansado

Há sempre uma qualquer melodia

Um trejeito

Feito gesto já esperado

Uma luz para acender

Uma fatia

De sombra fresca

Que o teu corpo me guardou.

Por isso vou pelo caminho

Tropeçando

A trocar os passos que dei

Com os que dou.

Daí a lentidão em perceber

Se ainda agora parti

Ou se já lá estou.


JReis (2005)


quinta-feira, 14 de maio de 2015

Surpreendam-se, pois, com as palavras do "nosso" poeta João Reis...




NOITE DE VERÃO


Sabes o que vou fazer

nesta noite quente de Verão?



Vou pegar na minha almofada

e recostar-me no parapeito da janela.

Vou em tronco nu enxotar os gatos

vou ver os meus vizinhos asseados

fazerem pontaria aos carros inanimados

com embrulhos de lixo voadores.

Vou ver os bêbados retardatários

vomitarem encostados às paredes

e apressarem-se a ir sovar as mulheres

(porque não podem sovar o Mundo).

Vou ver o guarda-nocturno a assoar-se

(embora seja uma noite quente de Verão)

e a verificar as fechaduras

(quem sabe se não estarão a assaltar-lhe a casa).


Escorrem-me pela testa rios de suor

caindo vagarosamente para o peito

que não afogam a revolta

de não poder dar uma sova de carinho

nem que seja na solidão.


Por isso sabes o que vou fazer

nesta noite quente de Verão?


Vou esperar o fim de todos os fins do Mundo

sem me rir dos bêbados

que sovam as mulheres a desoras

nem me preocupar com o lixo

que submergiu a cidade

nem com os gatos que miam à lua

nem com a ronda do guarda-nocturno

(quem sabe se não estarão a assaltar-lhe a casa)

nesta noite quente, quente de Verão.


                                                                    JR 1985

quinta-feira, 5 de março de 2015

Deliciem-se, pois...



ADEUS

Queria dizer-te – Adeus amor
e enterrar-te em mim
com um lençol bordado de poemas.

Queria dizer-te – Adeus amor
sombra silenciosamente diluída
no oceano dos ruídos imaginários
sem essa imagem desfocada
no fundo das tuas pupilas.

E não escrever a pulso este poema
Tangendo um filho recém-morto
Na planície dos fantasmas inocentes.

Queria ver antes do teu regaço
saltarem novas estrelas para o espaço
como faúlhas em fúria na fogueira.

Por isso esqueço (ou finjo que o faço)
dedos  famintos como sorrisos sufocados
à espera dos meus a noite inteira.

JReis - 2002


quarta-feira, 12 de novembro de 2014

AS PALAVRAS




As palavras povoam as horas

os pensamentos mastigam o cansaço

e o amor esconde-se

                                   num abraço.


As palavras enaltecem a pureza

de um coração retesado em arco

como a pedra atirada

                                   num charco.


As palavras vêm de atropelo

zurzir o nosso encolhimento

como rosto mordido

                                   pelo vento.


As palavras ferem, agitam, sibilam

como sirenes a conspirar no escuro.

Com palavras se projectam os homens

                                   Num muro.


As palavra extremaram a história

multiplicaram-se como pedras pelo chão

mas há lá maior força

                                   do que dizer NÃO!


JReis (2002)

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

AUTORETRATO



Para quê os olhos

nas alcovas das faces

a cheirar a maresia.

Olhos quadrados, a espreitar

as flores na multidão.

Olho-de-café

olho negro

a subir em espiral.

E para quê o tapete de cabelo

a pensar as nuvens

de longe interrogadas

em alegrias premeditadas

auscultando do vento

ruídos da guerra

se tudo há-de ser novamente

semente à terra.
                                                    JReis
                                                    1983

domingo, 12 de outubro de 2014

Quando eu morrer...



Quando eu morrer

na nudez da noite

ao som de trombetas tocando

silenciosos apelos à minha dor.

Quando eu deslizar

pelos caminhos iluminados de cristais

por entre os braços das nuvens

queima um a um estes poemas

numa fogueira de alma

como folhas a estalar de secura

nas mãos amarelas do Outono.

Queima-os que já são só morte

já não sibilam como flechas

a rasgar a consciência dos homens

a quebrar a monotonia inquieta

das goteiras de sangue

pelas veredas da cidade.

Não são mais do que os meus olhos

pesadamente debruçados sobre o mundo

nos ramos das árvores que se abraçam

como quem vai partir

e todavia não compra asas à imobilidade.





                                                                                                                         JReis - 1969

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

POEMA SEM FUTURO DETERMINADO


Não vai haver amanhã!
Nem sorrisos, nem palavras.
Alguém chegou e cortou a corrente
fechou portas, trancou janelas
e o tempo lá fora morreu de frio.
Organizaram-se comissões
pediram-se esclarecimentos
recolheram-se assinaturas
mas janelas e portas recusaram
um derradeiro ultimato para reabertura.

Deito-me e penso em ti
agora que já não existimos
(a alma do homem é feita de tempo).
O cérebro nega-se a aceitar o facto
de não ter mais noites
para acariciar os teus olhos no escuro
de já não poder respirar
a tranquilidade dos teus cabelos.

Não vai haver amanhã!
Penso mesmo que é necessário
voltar-me de lado e enlouquecer
(os loucos não usam relógio)
escrever um poema de baixo para cima
regular a abertura do abismo celeste
arrancar o coração, lavá-lo
e recomeçar a descida inapelável.





JReis (1995)

terça-feira, 3 de junho de 2014

poemas breves...




IV

Engenheiro?

Não trago o sonho exato

Na diagonal das noites retangulares.


V

MONOPARTIÇÃO

Ouve irmão

Eu trago em mim

O culto das coisas tristes

Religião de me lembrar

Que não existes



VI

Poema de Natal

É Natal, Natal de insónia

e estou de luto

- lágrima de orvalho derramando

um sorriso de escorbuto

                                                                                   João Reis

segunda-feira, 26 de maio de 2014

POEMAS BREVES


I




Início
Desta página em diante
Vou amar-te poesia.
E o meu amor será
Esperança de vinho em mosto
Lágrima de suor…
Sem rosto.

II

É noite…
E quem dera que a noite fosse de música
Para desespero da cidade adormecida.
Ah, mas eu não caio nas garras do sono
- Sou Poeta!
                               
                                               João Reis

terça-feira, 20 de maio de 2014

"Início"...


 
Início

Desta página em diante

Vou amar-te poesia.

E o meu amor será

Esperança de vinho em mosto

Lágrima de suor…

                                    Sem rosto.
 
                                                       
                                                                 João Reis

segunda-feira, 12 de maio de 2014

as palavras belas e doces derretem a algidez da vida...



À minha Mãe



Numa esquina do tempo
Espero ainda o desdobrar do meu destino
Nas rugas da tua face.

Eu já sabia – mais tarde ou mais cedo
Estávamos condenados a este desenlace
- eu criança velha a atrapalhar
A paz com que cortaste as amarras.

Sinto-me só mas tenho esperança
De um dia ainda voltar a ser criança

E te encontrar.
                                            
                                                 João Reis

(À minha Mãe)


2009/05/11

segunda-feira, 17 de março de 2014

JOÃO REIS - A POESIA TÃO PERTO DE NÓS...


LEIA E DELEITE-SE COM OS POEMAS DO POETA

JOÃO REIS


Maravilhem-se...

Obrigada, João Reis!


As noites de Inverno são frias
Como as cordas que me prendem à vida.
As sombras vagas, esguias
Como ramos de árvore ferida.

Os braços que estendo são quentes
Escravos da tua boca cerrada.
Quando falas sabem que mentes
Se perguntam, não dizes nada.

Os tristes dias que deslizam
Escorrendo por entre os meus dedos
Existem, não se realizam
Só me trazem novos segredos.

Meus olhos suspensos, vidrados
Não se cansam de encontrar
Os sonhos todos sonhados
As lutas sempre a acabar.

JReis
1968



Agora

como pedra a despertar do frio
para o sofrimento dos homens
em sapatos cambados
em cotovelos
com ângulos de escuridão

quem és tu que não trazes o sol
dormitando de tédio nas mãos
que chegue para apagar a teia gelada
que a Morte cismou à minha volta?

                                                           
JReis
1969


MEA CULPA


Não sou culpado do mar

nem a lua me atravessa.

Não sou culpado dos sonhos

não há sol que me despeça.


Não sou culpado da dor

não arraso firmamentos.

Tenho contrato fechado

com a rosa-dos-ventos.


Não sou culpado do corpo

nem me escondo da tormenta.

Não sou sequer a cadeira

em que o amor se senta.


Não sou culpado dos ossos

que me obrigam a roer.

Não sou culpado da morte

mas convertido a viver.


Não sou culpado da música

que a minha boca assobia.

“Mea culpa” é ter nascido

algum dia.
 
JReis
1974