As estreias em poesia são em geral tardias, e já tardava uma estreia com esta força...
As estreias na poesia portuguesa são em geral tardias. Mas já tardava uma estreia forte de um poeta nascido na segunda metade dos anos 1970. Miguel-Manso nasceu em 1979 e à beira dos trinta publicou dois notáveis livros de poemas: "Contra a Manhã Burra", edição de autor, e "Quando Escreve Descalça-se", edição da livraria Trama. As escassas centenas de pessoas que acompanham a nova poesia esgotaram com entusiasmo ambas as publicações, pelo que "Contra a Manhã Burra" volta a aparecer, agora com chancela da Mariposa Azual.
Todo o percurso biográfico de Miguel-Manso aponta para a deriva, um dos modelos canónicos da vida literária: estudou Design de Comunicação e desenho, foi bibliotecário e vigilante de museu, arranjou biscates, viveu em Paris e andou pelo Oriente. "Contra a Manhã Burra" tem uma evidente dimensão de viagem e aventura, notas soltas sobre pessoas e lugares (...).
Todo o percurso biográfico de Miguel-Manso aponta para a deriva, um dos modelos canónicos da vida literária: estudou Design de Comunicação e desenho, foi bibliotecário e vigilante de museu, arranjou biscates, viveu em Paris e andou pelo Oriente. "Contra a Manhã Burra" tem uma evidente dimensão de viagem e aventura, notas soltas sobre pessoas e lugares (...).
Crítica Ípsilon por: Pedro Mexia
NEM TANTA COISA DEPENDE
preferes o canto, o lugar oculto
a folhagem, a sombra, o quarto, este
saco de trigo: ouro de um texto
sobre a velha escrivaninha do real
lá fora o clarão do arvoredo
atalhos para a tingidura da paisagem
cá dentro menos caminho, outro
panorama: a presença tão-só
desabitada de uma pessoa, mistério sem
atributo ou função
sempre a desfeita de um coração
o cultivo intensivo das figuras
e sobram tristeza e dias ao corpo que escreve
no calabouço de uma manhã muito larga
reluzente de gotas de mel
enquanto os gatos lambem o sábado
e sentado, sapo de ouro, permites-te pôr no mundo
(mas porquê) outro poema
[in Ensinar o Caminho ao Diabo, edição do autor, 2012]
Parabéns pela escolha de Miguel Manso para o dia da poesia. Decerto é um homem marginalizado como o são todas as pessoas sensíveis hoje em dia.
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