quinta-feira, 14 de maio de 2015

Surpreendam-se, pois, com as palavras do "nosso" poeta João Reis...




NOITE DE VERÃO


Sabes o que vou fazer

nesta noite quente de Verão?



Vou pegar na minha almofada

e recostar-me no parapeito da janela.

Vou em tronco nu enxotar os gatos

vou ver os meus vizinhos asseados

fazerem pontaria aos carros inanimados

com embrulhos de lixo voadores.

Vou ver os bêbados retardatários

vomitarem encostados às paredes

e apressarem-se a ir sovar as mulheres

(porque não podem sovar o Mundo).

Vou ver o guarda-nocturno a assoar-se

(embora seja uma noite quente de Verão)

e a verificar as fechaduras

(quem sabe se não estarão a assaltar-lhe a casa).


Escorrem-me pela testa rios de suor

caindo vagarosamente para o peito

que não afogam a revolta

de não poder dar uma sova de carinho

nem que seja na solidão.


Por isso sabes o que vou fazer

nesta noite quente de Verão?


Vou esperar o fim de todos os fins do Mundo

sem me rir dos bêbados

que sovam as mulheres a desoras

nem me preocupar com o lixo

que submergiu a cidade

nem com os gatos que miam à lua

nem com a ronda do guarda-nocturno

(quem sabe se não estarão a assaltar-lhe a casa)

nesta noite quente, quente de Verão.


                                                                    JR 1985

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