ATÉ AMANHÃ
Baço, tímido e cansado
teu rosto espreita
em qualquer esquina de mim.
Teus olhos emboscados
dedilham a minha insónia
esperam que soe a última badalada
do desespero nocturno
na cidade silenciosa.
Amanhã
ao romper do dia inevitável
dir-te-ei rosas (ou talvez lilases).
Dir-te-ei da distância infinitesimal
que vai da morte à consciência
que se tem quando se vive
aqui
assim
até
uma nova morte nos embotar os sentidos.
Dir-te-ei
que a noite é feita de cigarros acesos
de suor, de mesas de cabeceira
de torneiras a gemer água corrente
de mulheres defraudadas.
Dir-te-ei
que por dentro de mim
cresce um espaço em que já ninguém cabe
que em silêncio me insulto
e me perdoo
que sou livre e sinto na testa
um frio de grades
que já não sofro e os meus ossos rangem
que quis fazer as malas
e não tinha nada para lhes meter dentro.
Dir-te-ei
que já não tenho a certeza
de que, sendo hoje domingo
amanhã seja segunda-feira.
Dir-te-ei apenas
“amor” por desfastio
Pendurarei teus cabelos num poema
Dir-te-ei
-
até amanhã.
JReis
2003
Leio e releio o teu poema sem cessar...
ResponderEliminarPara além de apresentar uma densidade indescritível, a beleza das tuas palavras atordoa-nos extraordinariamente...
Maravilhoso...
Este é só o primeiro, entre muitos outros que aguardamos...